segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Em um lapso de memória, mulher com Alzheimer lembra o nome da filha

Kelly Gunderson é filha de uma de senhora de 87 anos que possui Alzheimer, que por conta da doença já está com a memória bastante debilitada. Mas, por alguns instantes ela se recordou do nome da filha que, por sua vez, ficou emocionada com a situação. “Eu não te dei o nome de Kelly?”, perguntou a senhora para a filha:

ALZHEIMER: Quanto antes souber, mais tempo terá para lembrar


A Doença de Alzheimer é uma enfermidade incurável que se agrava ao longo do tempo que pode e deve ser tratada. Se diagnosticada precocemente e tratada de forma correta, é possível retardar sua evolução, garantindo melhor qualidade de vida ao paciente e à família.

Quase todas as suas vítimas são pessoas idosas e talvez por isso, a doença tenha ficado erroneamente conhecida como “esclerose” ou “caduquice”. Ela é um tipo de demência com perda de funções cognitivas (memória, orientação, atenção e linguagem) causada pela morte de células cerebrais.

Seu nome oficial refere-se ao médico Alois Alzheimer, o primeiro a descrever a doença, em 1906. Ele estudou e publicou o caso da sua paciente Auguste Deter, uma mulher saudável que, aos 51 anos, desenvolveu um quadro de perda progressiva de memória, desorientação e distúrbio de linguagem (com dificuldade para compreender e se expressar) tornando-se incapaz de cuidar de si. Após o falecimento de Auguste, aos 55 anos, o Dr. Alzheimer examinou seu cérebro e descreveu as alterações que hoje são conhecidas como características da doença.

A idade é o principal fator de risco para o desenvolvimento da Doença de Alzheimer (DA). Após os 65 anos, o risco dobra a cada cinco anos.

As mulheres parecem ter risco maior para o desenvolvimento da doença, mas talvez isso aconteça pelo fato de elas viverem mais do que os homens. Embora não seja considerada hereditária, há casos, principalmente quando a doença tem início antes dos 65 anos, em que a herança genética é importante. Esses casos correspondem a 10% dos pacientes com Doença de Alzheimer.

Pessoas com histórico de complexa atividade intelectual e alta escolaridade também podem desenvolver a doença, porém, em um estágio mais avançado da atrofia cerebral (atrofia natural com envelhecimento), pois é necessária uma maior perda de neurônios para que os sintomas de demência comecem a aparecer. Por isso, uma maneira de retardar o processo da doença é a estimulação cognitiva constante e diversificada ao longo da vida.

Há outros fatores de risco considerados importantes e modificáveis que estão relacionados ao estilo de vida como: hipertensão, diabetes, obesidade, tabagismo e sedentarismo.
Os sintomas iniciais da Doença de Alzheimer comumente são confundidos com o processo de envelhecimento normal. Recomenda-se que, diante dos primeiros sinais, as famílias procurem profissionais e/ou serviços de saúde especializados, que a partir de exames e da história do paciente, definirão a principal hipótese para a causa da demência.

Exames de imagem como tomografia ou, preferencialmente, ressonância magnética do crânio, devem ser realizados para excluir a possibilidade de outras doenças. A avaliação neuropsicológica envolve o uso de testes psicológicos para a verificação do funcionamento cognitivo. Os resultados, associados aos dados da história e da observação do comportamento do paciente, permitem confirmar o diagnóstico.

Com a progressão da doença as limitações ficam mais claras e mais graves. A pessoa com demência tem dificuldade em suas atividades no dia a dia e em estágio avançado há a total dependência e inatividade.

Até o momento, não existe cura para a Doença de Alzheimer. Os avanços da medicina permitem que os pacientes tenham uma sobrevida maior. O objetivo do tratamento é aliviar os sintomas existentes estabilizando-os ou permitindo uma progressão mais lenta da doença.

Iniciativas que priorizam o contato social dos pacientes estimulando as habilidades de comunicação, convivência e afeto, promovem integração e evitam a apatia e a inatividade diante de dificuldades. Alguns estudos mostram que atividades físicas regulares estão associadas à evolução mais lenta da Doença de Alzheimer.  A cada etapa da doença, profissionais especializados podem ser indicados para minimizar problemas e orientar a família com o objetivo de favorecer a superação das limitações e enfrentar o processo de adoecimento, mantendo a qualidade do relacionamento e do cuidado entre as pessoas envolvidas.

História de superação

A história de Roseny de Freitas Alves, 54 anos, daria um livro. Ou melhor, dois.
Roseny nasceu em Novo Horizonte, com paralisia cerebral. Por conta da doença, ainda criança começou a apresentar dificuldades para se locomover e falar, o que não impediu seu completo desenvolvimento cognitivo.

Foi alfabetizada em casa pela mãe, Clarice, e as tias, professoras, que lhe despertaram o gosto pela leitura e pela escrita. Tanto que já publicou “Minha História em Crônicas”, com edições esgotadas em 1999 e 2000, e “Literatura: Minhas Palavras”, lançado em 2010 e 2011.

Radicada em Rio Preto há cerca de 20 anos, Roseny gosta das obras de Clarice Lispector e Paulo Coelho, mas garante que não se inspira em outros autores para criar. Assim como Clarice, diz que não pretende agradar ninguém.

Bem...

“Ninguém” pode não ser a palavra mais apropriada. O pai, Seu Luiz, 79 anos, é figura recorrente em seus textos e dedicatórias. Em um dos exemplares da obra de estreia, a letra trêmula feita à caneta azul faz um lembrete: “Eu adoro ser sua filha, sabia?” A declaração de amor continua no trabalho seguinte, com “Meu Maior Amor, Meu Pai”, em que compara a presença dele ao nascer do sol. “O futuro é hoje, como disse Clara Clarice. Meu amanhecer não seria o mesmo sem o senhor para dar-me um ‘bom dia’! E esse bom dia tem a duração de vinte e quatro horas de paz se depender só do senhor, meu pai querido!”, diz, no trecho inicial.

Durante toda a vida, Seu Luiz foi o grande companheiro de Roseny para passeios e diálogos que a faziam sorrir. Companheirismo intensificado com a morte da mãe, em 1993. O sofá puído da sala, que contrasta com o quadro de girassois, símbolo de felicidade, revela em parte a vida simples da família Alves. Pai e filha sobrevivem dos proventos de aposentadoria e pensão, mas o dinheiro não parece ser suficiente para suprir as necessidades da nova fase da vida dos dois.

Seu Luiz, que começou a apresentar os primeiros sinais de Alzheimer há sete anos, já não fala e pouco se movimenta. Três meses atrás, sofreu um infarto e permanece hospitalizado, em estado debilitado. Na última semana, recebeu alta médica, mas, menos de 24 horas depois, foi obrigado a deixar a própria casa outra vez. A solidão e o sentimento de incapacidade para ajudá-lo se transformam em coragem para uma visita na UTI. Roseny se desmancha em lágrimas ao se lembrar da mão dele, gelada e atrofiada, durante sessão de hemodiálise numa máquina que ela nunca tinha visto antes.

“Choro agora de saudades, choro pela luta diária do meu pai. Mas choro pela sua vitória, choro por ter que pôr um avental branco e luvas para poder chegar perto dele. Choro por ele que não chora. Talvez não saiba mais quem sou eu, mas sente o meu carinho, o calor das minhas mãos encobertas pelas luvas, mas que não retém o meu carinho”, escreveu, nas redes sociais. A filha dedicada quer retribuir os cuidados que sempre recebeu, seja no próprio lar ou em uma casa de repouso - visto que os equipamentos e funcionários necessários para mantê-lo por perto são bem caros e o convênio médico não se compromete em custeá-los.

Em uma tentativa - até desesperada, pode-se considerar assim - de conseguir dinheiro extra para arcar com os gastos, Roseny colocou à venda os últimos 47 exemplares de “Literatura: Minhas Palavras”. O material pode ser adquirido na Biblioteca Municipal de Rio Preto, por R$ 20 cada unidade. Até o fechamento desta edição, havia sido vendido 1 exemplar. Ela não pretende voltar a escrever tão cedo. Além dos entraves mercadológicos para comercializar títulos sem fama, há o agravante emocional. Mas a literatura segue como coadjuvante de uma história repleta de superação e silêncio.

sexta-feira, 26 de setembro de 2014

Depoimento de uma cuidadora de paciente com Alzheimer

Depoimento de Maria Inês Duarte – Juiz de Fora - MG, que orgulhosamente permitiu a divulgação de sua identidade, para tentar ajudar outras pessoas.


Briguei muito comigo mesma, porque escrever sobre a doença que Dr. Alzheimer esclareceu é como mexer na ferida quando está quase fechando. Como todos os fatos óbvios só se tornam óbvios quando nos damos conta que era inevitável, aqui estou eu, faz dias, escrevendo e, como eu mesma falo, bordando as letras para que meus sentimentos se acomodem e eu consiga colocar as idéias em ordem.
Cinco anos faz que comecei a estudar sobre a doença e hoje, dia trinta e um de agosto de dois mil e três, completam oito meses que minha mãe está comigo em Juiz de Fora. A intenção de escrever não é só para alívio da minha alma, mas para que outros possam se beneficiar com a minha experiência.
Nesse tempo que estou envolvida com a doença, quanto mais eu ouço, mais leio ou assisto a documentários, maior minha adaptação ao meu novo mundo. Já disse antes que me sinto pega por uma nave de outro planeta e ainda não sei bem para onde vou e como chegar, mas com certeza minha mãe está comigo. Ela não tem condições de se manter a não ser com alguém que a ajude e, por hora, sou eu. Quem sabe escrevendo ajudo outros cuidadores a entender mais um pouco sobre a doença de Alzheimer?
As revistas e programas de saúde têm tentado explicar a doença para auxiliar de todas as maneiras a família envolvida. Dificilmente conseguem, pois não vivem os problemas fora do consultório, na sua pele. Na verdade, o que não se sente, supõe-se.
A doença é sinistra, como diria meu aluno adolescente. Ela faz com que o paciente perca a memória e tendo momentos de lucidez e afirmações convictas, poucos acreditam que esteja doente. Feliz do paciente que em tempo tem ao seu lado alguém que descobre e consegue acreditar que ele está doente.
O cérebro vai aos poucos morrendo, mas não avisa qual parte vai morrer e nem quando. Por isso, você nunca sabe como estará o paciente. Afinal ele não tem noção da doença, tem sensação de que acontece alguma coisa estranha com ele, sem saber discernir. Percebe só que não consegue resolver coisas simples, quanto mais as complexas. Não há cognição constante e aí começa o dilema.
Alguns familiares acreditam que não há o que fazer, contar a verdade é o melhor, outros acham que é brincadeira do paciente, perdem a paciência com as coisas tolas e, muitas vezes, constrangedoras que o paciente faz. E esse coitado sente, chora, se envergonha sem saber resolver nada, fica envergonhado, acuado como criança pequena ou como se estivesse sendo humilhado.
Minha mãe mora desde dezembro em Juiz de Fora, mas todos os dias acha que veio do Rio, lugar onde morou muitos anos. Como vai e volta para o Rio só a cabecinha dela sabe. Detalhe é que ela nunca mais foi ao Rio, desde dezembro. Aprecia artes e sempre vamos para exposições e ao cinema, lugares onde possa apreciar boa música ou bons livros e, como ainda reconhece algumas amigas minhas, sempre que tenho oportunidade, ela está com elas. De uma hora para outra não sabe onde foi e nem lembra de alguma coisa fundamental. Repentinamente surpreende com alguma observação lúcida a respeito de alguma coisa que viu, desarmando qualquer cientista.
Fico geralmente esperando para responder de tal maneira que não a confunda e me convenço da história que conto, mesmo que seja muito fora da realidade, mas com coerência. Não a contrario nunca e sempre procuro tratá-la como uma criança que supervisionada pode até ajudar em algumas tarefas. Logo que veio para Juiz de Fora minha amiga, duvidando da doença, acabou se distraindo e, numa ocasião em que estava com minha mãe, deixou que ela usasse o fogão. Mamãe ligou todas as bocas sem usar fósforo e saiu da cozinha como se nada tivesse feito. Os anjos da guarda nesse dia trabalharam exaustivamente.
Quando o médico me disse que mamãe estava mudada e eu já havia percebido o temperamento completamente diferente, foi como se eu tivesse recebido uma notícia boa. É como se tivesse sido um presente, pois na verdade de brava, mamãe passava para meiga, só que com Alzheimer... Como um feitiço da história infantil, sem possibilidades do príncipe aparecer e salvar a mocinha.
Desde o início constatei que a cura não existe ainda, que até o final da doença estará sem conhecer as pessoas, em cima de uma cama, talvez vegetando.
Convivo com um medo tão grande - de não dar conta e de deixar minha mãe sem assistência - que a coragem cada vez aumenta mais. Brigando todos os dias para vencer esse medo, eu até agora tenho vencido. Mas na luta contra o dito cujo, eu conto com meu marido, meus filhos e minha irmã que mora no exterior, mas sempre está me apoiando.
Entrei para o grupo de cuidadores de pacientes com Alzheimer, reunimo-nos freqüentemente recebendo orientação dos médicos, psicólogos e outros profissionais interessados na causa. Fundamental para que nós, cuidadores, sobrevivamos. Em Juiz de Fora, uma vez por mês temos o encontro e, semanalmente, há na Universidade Federal de Juiz de Fora, na faculdade de Fisioterapia, um grupo nos orientando junto à faculdade de Psicologia.
Existe paciente que fica o oposto de minha mãe e a agressividade é tão grande que agride fisicamente inclusive a pessoa que cuida dele. Celso, portador de Alzheimer, algumas vezes em seus delírios tem certeza de que a mulher dele não é quem cuida dele, pede para que vá embora da casa e a agride dizendo que ela é estranha! Eu vejo o quanto a esposa dele sofre...
Tem outro paciente que não reconhece mais os amigos. Acredita que todos o perseguem, chegando ao cúmulo de acreditar que alguns o matarão ou roubarão seu dinheiro. Deixa alguns da própria família sem poder entrar na sua casa e sofre muito com a possibilidade de ser traído pelos familiares. São delírios que o paciente pode ter e que muitas vezes não tendo assistência médica, passam a ser taxados de malucos.
Muito triste para nós lúcidos que convivemos com eles, mas pior é conviver com os familiares que por motivo ainda não identificado por mim, ignoram a doença e deixam o paciente completamente sozinho. Caso de polícia, segundo um amigo meu. E é.
Mamãe tem fisioterapia e terapeuta ocupacional três vezes por semana e toma os medicamentos necessários para que tenha momentos de distração e de tratamento. Sei o quanto ela gosta de música e sempre recomendo os CDs para que ela ouça na hora que o profissional da saúde está com ela. Também já fez trabalhos manuais e pinturas, assim a terapeuta ocupacional diversifica as atividades e proporciona momentos agradáveis.
Algum proveito há que se tirar dessa situação e acredito que estou entendendo o recado que me deram. De uma hora para outra você pode adoecer, ficar nas mãos de outros, podendo ou não ser tratada com dignidade.
Por isso, enquanto somos lúcidos devemos aproveitar o dia para sermos e fazermos os outros felizes. Mamãe foi pega de calça curta, como se diz na linguagem popular, sem chance de desfazer mal entendidos, de dizer que amava as pessoas, e de ser feliz. Passou muitos anos brigando com a própria sombra e, embora sendo uma pessoa de boa índole e bom caráter, alguma coisa aconteceu, numa hora qualquer da sua vida, que embora ela não aceitasse, não soube dar marcha ré e recomeçar. Ela perdeu a oportunidade de ter sido feliz enquanto lúcida... Agora o mundo para ela é cor de rosa, vive num mundo de faz de conta, onde todos são bons e ela é muito feliz. Se depender de mim, ela não sai mais desse mundo do faz de conta e quando estiver em outro plano saberá que tudo que fiz foi por amor, mesmo sem jamais termos tido a oportunidade, enquanto lúcida, de dizermos isso uma à outra.

Homem que cuidou de pai com Alzheimer é diagnosticado com a doença; veja o depoimento

Carlos Stocco, 70 anos, cuidou do pai, Antônio Stocco, que tinha Alzheimer e morreu há oito anos. Há um ano ele foi diagnosticado com princípio da doença e voltou a frequentar as reuniões e encontros sobre a doença para saber as mudanças e novos medicamentos para se tratar. Durante a conversa com o UOL, Carlos não conseguia lembrar datas específicas, mas se recordava bem das experiências do passado. Ele afirma que não ficou surpreso com o diagnóstico e conta como foi cuidar do seu pai. A imagem feita há 10 anos mostra Carlos Stocco ao lado do pai, Antonio Stocco, diagnosticados com Alzheimer

Leia o depoimento:

Quando o geriatra diagnosticou meu pai, Antonio Stocco, com Alzheimer sai do consultório e não sabia nem escrever o nome da doença para procurar a respeito na internet. Por não ter conhecimento sobre a doença, não chorei e não tive nenhuma reação ao saber do diagnóstico.A imagem feita há 10 anos mostra Carlos Stocco ao lado do pai, Antonio Stocco, diagnosticados com Alzheimer
Logo comecei a procurar grupos em que eu pudesse me informar, fui a vários deles, dos mais específicos e técnicos aos que ajudavam os familiares a lidar com a doença. Como estava aposentado, tinha tempo de frequentar as reuniões.
Portanto, quando fui diagnosticado com princípio de Alzheimer há um ano, a primeira coisa que voltei a fazer foi frequentar as reuniões para me atualizar sobre as mudanças e os novos medicamentos para tratar a doença.
Quando meu pai morreu, há sete anos, eu frequentava as reuniões em solidariedade, mas depois acabei parando de vez de frequentar o grupo.
Nos primeiros sinais da doença, procurei um geriatra de um hospital particular que aplicou diversos testes, mas, ainda assim, era preciso fazer o exame neuropsicológico para confirmar a doença, mas o teste era muito caro.
Procurei o Hospital São Paulo, fiz o teste e o médico disse que por eu ter um bom nível de instrução era ainda mais difícil identificar a doença, mas que preferia começar a tratar agora do que esperar para cuidar da doença quando eu já estivesse 'lelé'.
Hoje, eu tomo o mesmo remédio de uma pessoa que já tem Alzheimer em fase inicial. Como sempre soube que era forte candidato, não fiquei surpreso com o diagnóstico e pude começar a tomar remédios desde o início, ao contrário do meu pai, que identificou a doença bem tarde e não havia mais chance de resolver o problema com medicação.
Depois de seis meses que ele foi diagnosticado, eu o levei ao Hospital São Paulo e o médico que o examinou afirmou que ele já deveria estar com Alzheimer há uns cinco anos, o que explicou bastante alguns comportamentos que ele já estava tendo, como sumiço de dinheiro e se eximir das responsabilidades.
Eu costumava levá-lo ao barbeiro que é do lado de casa e ele voltava sozinho, mas comecei a notar que a doença estava o afetando muito quando o barbeiro apareceu em casa com ele, pois ele não sabia mais como voltar.
Nesses momentos, as reuniões que eu frequentava ajudaram muito, pois eu via os depoimentos e já me preparava para lidar com situação quando ela acontecesse.
Mas meu pai foi muito bom durante a doença, muito tranquilo. Ele nunca foi agressivo comigo ou me mordeu, como algumas pessoas relatavam que seus familiares faziam.
Quando a doença ficou mais avançada era bem difícil a hora de tomar banho e os remédios. Ele não conseguia mais engolir e engasgava com líquidos.
Enquanto ele estava doente eu voltei a trabalhar e levava ele para uma casa de repouso ao lado do meu trabalho todos os dias. Era engraçado porque, mesmo debilitado pela doença, ele ia o caminho inteiro falando e era capaz até mesmo de ler os anúncios na rua.
Ele ficou internado por dois meses no final da vida, só se alimentava por sonda. Nós ainda assim tentamos manter ele casa, mas ficou muito complicado. Procuramos uma clínica e ele morreu depois de um mês.
Eu o visitei todos os dias, sempre ia lá fazer a barba. Eu ainda acho que ele morreu reconhecendo os familiares porque, nos últimos dias, ele sorria e se sentia bem quando tinha contato com a gente.


quinta-feira, 25 de setembro de 2014

Reflexão: Carta de uma mãe com Alzheimer para sua filha

Querida filha, escute com atenção o que tenho para falar. O dia que esta doença se apoderar totalmente de mim e eu não for mais a mesma, tenha paciência e me compreenda. Quando eu derrubar comida sobre minha roupa e esquecer como calçar meus sapatos, não perca sua paciência.
Lembre-se das horas que passei lhe ensinado essas mesmas coisas.
Se ao conversar com você repito as mesmas palavras e você já sabe o final da historia, não me interrompa e me escuta. Quando era pequena tive que contar-lhe mil vezes a mesma historia para que você dormisse.
Quando fizer minhas necessidades em mim, não sinta vergonha nem fique brava, pois não posso controlar-me. Pense em quantas vezes, quando era uma menina, te limpei e te ajudei quando você também não podia controlar-se.
Não se sinta triste ao me ver assim. É possível que eu já não entenda suas palavras, mas sempre entenderei seus abraços, seus carinhos e seus beijos.
Te desejo o melhor para sua vida com todo o meu coração.
Sua mãe.

História contada por Virginia Celia

A partir dos diagnósticos de demência vascular e demência de ALZHEIMER de minha querida MÃE em 14/03/2013, tenho passado por longas e silenciosas METAMORFOSES em minha vida. De Servidora Pública de Carreira, Assistente Social, passei a assumir um novo papel, o de “CUIDADORA".
Um abismo abriu-se em minha volta. Várias perguntas ficaram sem respostas. Por que com a minha amada mãe? Muitas crises de choro, muita dor, depressão, impotência, revolta, ou seja, um somatório de sentimentos que somente quem convive com um portador de Doença de Alzheimer - DA, tem esta compreensão.

Após o choque inicial acompanhado de uma avalanche de sentimentos, busquei informações da DA, através de leituras médicas, artigos na Internet e visitas a vários blogs que tratam desta doença. Resolvi compartilhar os conhecimentos adquiridos, os sentimentos e as emoções enquanto CUIDADORA, com a criação deste blog. Não pretendo transformar em um "Diário de uma CUIDADORA".

A partir de então, o blog passou a funcionar como uma terapia, um divisor de águas em minha vida. É puro sentimento. Busquei colocar como categorias depoimentos, artigos, crônicas, poesias, vídeos, dentre outros, tendo em sua essência maior: DA, o CUIDADOR DE IDOSO e a VELHICE. Um novo olhar da velhice em seu somatório de trajetória de vida enquanto ser humano. As mudanças, as transformações operadas em cada pessoa, tanto no nível biológico, quanto no emocional e psicossocial.

Não poderia deixar de colocar a categoria de “Música”, tão importante em nossas vidas. A música altera nosso estado de espírito. O corpo reage às vibrações dos sons, despertando emoções que interferem no funcionamento de nosso organismo. Tudo na minha vida tem um fundo musical. A vida , as lembranças , os momentos de uma pessoa , não teriam sentido sem a música. Costumo , por exemplo , “afogar “ minhas mágoas ouvindo música. Ela alegra a alma, alivia o espírito, acalma , relaxa , e até mesmo serve como um combustível diário à medida que nos dá força e esperança para crer em dias melhores.

O abismo inicial foi substituído por uma fortaleza, claro que com muitas rachaduras, precisando diariamente de retoques para não desabar. Todos os procedimentos requeridos para o tratamento da doença foram tomados, um verdadeiro exército de profissionais: neurologista, psicólogo, terapeuta ocupacional, fisioterapeuta, geriatra, etc. para o tratamento de minha amada mãe.
Infelizmente, mesmo com o avanço da medicina, a DA não tem cura. É uma constante evolução. Apesar de todo o acompanhamento de profissionais de saúde, bem como o tratamento medicamentoso/farmacológico, é imprescindível uma associação maior ao tratamento: o AMOR e o CUIDAR.
Tenho hoje um pouco de conhecimento da doença e os sentimentos e emoções vivenciados pelo CUIDADOR, em função da minha experiência no dia a dia, o que me leva a compartilhar com as pessoas que estão convivendo com esta realidade.
(Virgínia Célia)

Artigo sobre o livro: '' O LUGAR ESCURO'' de Heloisa Seixas


Esta é a história real da lenta transformação de uma mulher, no caso a mão da escritora Heloísa Seixas, que escreve seu primeiro livro de não-ficção. 


O lugar Escuro é o relato do que a autora viveu, ao acompanhar o cotidiano de sua mãe - atingida pelo Mal de Alzheimer que , aos poucos, passa a sofrer com a modificação completa de sua personalidade, mudando também a vida de todos em volta.   

 A história da degradação de uma mente comprometida, em todas as suas fases, num pesadelo familiar da própria autora.  

Este livro nos conta como começa a doença, o mal de Alzheimer, antigamente era diagnosticada como loucura ou senilidade e caduquice mesmo. Criaram este nome novo pela descoberta de Alzheimer que ficou “mais leve”, sem denotar muito o estigma da loucura.

     O mal de Alzheimer pode decorrer de um processo de sofrimento como a depressão, solidão, isolamento social, desamparo, repressão longa, pode ser hereditária, depois de alguma perda, choque emocional muito grande em que a pessoa vai convivendo mais não supera.

     O livro em questão conta a história de uma senhora que foi perdendo a memória gradativamente, tinha mania repetitivas tais como: se arrumar a noite pensando que ia numa festa; ficava esperando a filha chegar do trabalho para levá-la, a filha tinha que inventar mil desculpas todos os dias para acalmar a mãe, cada dia era uma festa diferente. Depois a mãe começou a ver pessoas mortas e conversava com elas. Parecia ser sintomas de esquizofrenia...

     Muitas vezes a mãe ficava nervosa, outras calma demais, cheia de manias. Seu cérebro habitava a região da loucura. Certa vez assinou 17 revistas diferentes, se perdia na rua, gastava dinheiro ou perdia, fantasiava, ria sem parar, outras chorava, ia percebendo que a memória ia ficando curta e tentava disfarçar. Era uma mulher que sabia cozinhar, bordar, tricotar, receber, se arrumar e de repente a loucura tomou conta sendo preciso acompanhante para dar banho, comida na boca, etc. Desenvolveu medos estranhos, seus músculos foram parando de funcionar, sua vida parando, esqueceu se tudo, não conhecia mais ninguém...transformou-se em uma criança de uns dois anos ou menos...

     É uma trajetória que começa aos poucos e vai tomando conta da pessoa, parece que uma entidade vai tomando conta de tudo, do cérebro, minando a inteligência, o pensar. A pessoa começa lembrando coisas que marcaram, que fizeram sofrer, se torna metodicamente repetitiva, desagradável e pedante. É um sofrimento enorme para o cuidador e toda família, pois não é fácil viver com uma pessoa “louca”, com personalidade antagônica, misteriosa e escura...

     Escrevi sobre esta resenha pois dizem que nós escritores e poetas estamos na “fronteira da loucura”. Deus queira que não, mas temos sentimentos muito aflorados, nada nos escapa, somos seres muito sensíveis, ficamos tristes ou alegres demais. Nossas emoções são diferentes, sofremos por qualquer coisa, choramos, somos felizes ou infelizes ao extremo...

     Finalizando, aconselho a todos a se cuidarem, não se reprimir mesmo, soltar o que está dentro de si, pois isto pode nos ajudar sim, na saúde psicológica e física evitando somatizações. Cuidar e tratar de depressões químicas ou psicológicas ou seja, endógenas e exógenas. No meu caso vou levando a vida aproveitando cada minuto, pois sofro de depressão química há muitos anos...se disser que não tenho medo também estaria sendo falsa pois também sou humana e é preciso sempre encarar a realidade para ter qualidade de vida...

     A depressão severa pode levar ao suicídio, ao isolamento, a fobias sociais, síndrome do pânico e muito mais. A informação nunca é demais pois em nossas famílias pode ter casos...A depressão deve ser tratada e não ignorada. atualmente sabe-se que remédios para hipertensão e diabetes, podem causar a depressão química (biológica). Infelizmente muitas pessoas ainda não acreditam em depressão, falam até que é adquirida, porém a vida pode surpreender as pessoas que muito julgam, a roda da vida é implacável...Já ouvi alguém falar que depressão é falta de Deus, mas se muitos quando se desesperam vão á igreja procurar alivio, não podem também estar passando por depressão...eta resistência e negação humana...


As histórias desta mulher que cuida da mãe com Alzheimer deixam a gente rindo e chorando ao mesmo tempo

“Você podia ser minha filha”.

Ana Heloisa Caldas Arnaut cuida da mãe Anna Izabel, que tem Alzheimer, desde 2003. Ela sempre registrou os momentos das duas em fotos e vídeos.
Depois que um destes vídeos viralizou, Ana Heloisa decidiu contar seu dia a dia com a mãe na página “Alzheimer - Minha Mãe Tem”.
Ela fala, com simplicidade e humor, dos momentos do dia a dia. E completa seus depoimentos com informações importantes sobre a doença e os cuidados não só com os afetados, mas também com os cuidadores.

Para Ana Heloisa, uma das melhores coisas de ter criado a página é receber o retorno de pessoas mais jovens. “Eles me dizem: ‘quero ser como você com os meus pais’”, ela conta em entrevista ao BuzzFeed Brasil.
Abaixo, leia algumas das histórias de Ana e sua mãe, ilustradas por fotos das duas:
Mãe era muito falante, adorava conversar e fazer novas amizades. E fazia com a maior tranquilidade. Um dia fomos ao supermercado e subimos de elevador. Quando a porta abriu, o elevador era todo espelhado. Ela não teve dúvida, olhou no espelho com um baita sorriso e cumprimentou ela mesma.
Tinha uma senhora dentro que não entendeu nada. Na hora de sair, ela se despediu da senhora e olhou para o espelho e deu tchau. Aí eu e o Nelson não aguentamos e choramos de tanto rir. E ela ria com a gente.
Devemos aproveitar esses momentos para tornar o dia a dia mais leve. Se não enlouquecemos.

Algumas pessoas comentaram que elas gostam de bebês para cuidar. Minha mãe não gosta. Teve uma vez que fomos na casa de um conhecido e a esposa dele tinha um. Ela trouxe e deu para ela brincar. Ela achou lindo. Então perguntei: “a senhora quer um desse?A Ela na mesma hora me respondeu, balançando as mãos. “Não, é muita responsabilidade”, e entregou o bebe para a dona na mesma hora. kkkkkkkkk
Ela então deitou e ficou comigo um pouco. Mas logo saiu e não voltou mais. Foi para sala, sentar pegar um livro e ficar ali o dia todo, apenas na primeira página. Se chamasse para fazer alguma coisa, dizia “agora não posso, essa leitura está muito interessante”. Se perguntava o que está lendo, ela dizia “você está me atrapalhando”. kkkkkkk Quando resolvia parar, eu perguntava o que a senhora estava lendo de tão interessante? Ela me respondia: “Eu não estava lendo nada”. kkkkkkk

Na fase de repetição ela recitava o dia inteiro. Antes ela perguntava “você conhece essa poesia?” e repetia de novo, de novo, de novo… Quase enlouqueci nessa época. Depois passou a cantar a mesma música. Teve uma fase que contava os números o dia inteiro, que até nós nos pegamos várias vezes contando também.

Sinceramente, até hoje não entendi como ela conseguiu fazer isso. Não sei se repararam, é um lenço que colocou.

“Para falar a verdade, nós somos duas ignorantes. Não conta nada para ninguém”. E ela mesmo começou a rir rsrsrs

Papo de ontem à noite:
Levei ao banheiro como todos os dias, colocamos a fralda, lavamos as mãos e o rosto e fomos para o quarto. Trocamos de roupa e coloquei na cama. Deixei ela com o Nelson e fui buscar o remédio. Escutei ela falar para ele: “Que mocinha rápida, gostei dela”. Quando voltei com o remédio, ela me perguntou:
Mãe: Você gostou de mim?
Eu: Gosto muito. E você gosta de mim?
Mãe: Gostei, você é muito educadinha.
Eu: Muito obrigada.
Mãe: Você quer trabalhar aqui?
Eu: (segurando para não rir) A senhora paga bem?
Mãe: Quê?
Eu: (fazendo gesto com os dedos de dinheiro) A senhora paga bem?
Mãe: Falou algo que não entendi. Mas com uma mão estendida e a outra como se estivesse escrevendo, e balançando a cabeça que sim.
Eu: Entendi, vai assinar a minha carteira né?
Mãe: dando um sorriso diz que sim.
Bem, não estou mais aposentada fui contratada ontem com todos os direitos. kkkkkkkk
Quero apresentar para vocês a minha amiga e vizinha Dani Melote, que sempre me socorreu em momentos difíceis. (…) Segue o relato que ela acabou de me enviar:
“Fico muito feliz em ter a Ana e a Dona Ana como vizinhas. Com elas tive a oportunidade de ver de perto este carinho e dedicação entre as duas assim como aprender um pouco sobre o Alzheimer. É muito legal saber levar os momentos com leveza. Neste tempo muitas coisas aconteceram e alguns momentos me marcaram muito.
Uma vez nós duas estávamos assistindo novela e uma das características da doença é não distinguir se a pessoa na tv ou em uma revista está presente fisicamente conosco. Estávamos olhando para a tela e ela virou para mim com a mão em concha e cochichou:
- Nossa! Que povo mais feio! Parece assombração!
Concordei com ela e começamos a rir, e ela completou:
- Mas se perguntarem a gente diz: “Tá linda! Nossa, mas tá linda!”
Depois de um tempo ela me disse:
- Você é como uma irmã para mim, quando sairmos na rua e alguém perguntar vamos dizer a todos que somos irmãs, eles não nos conhecem e vão acreditar. E quando eu estiver em casa e for sair e papai perguntar aonde eu vou eu digo:
“Vou encontrar com a minha amiga, minha irmã”.

— Você podia ser a minha filha.
— Eu sou sua filha, mãe.
O vídeo que começou tudo tem o diálogo acima e é de um dos papos que as duas batem antes de dormir:

A página, que acaba de completar um mês, é um sucesso estrondoso. E não é difícil entender porquê. <3

terça-feira, 23 de setembro de 2014

Alzheimer, amor e carinho são os melhores remédios




Russos testam medicamento que pode reverter Alzheimer

Por Otaviani
Rádio Voz da Rússia
Cientistas russos estão testando um novo medicamento que salva as células nervosas da destruição. No futuro, esta substância poderá combater as patologias mais difundidas do sistema nervoso – a doença de Parkinson e de Alzheimer, derrames e até mesmo a depressão.

Agora, a invenção está na fase de testes complementares. Os especialistas acreditam que o medicamento será aplicado já nos próximos anos.

O combate às doenças do sistema nervoso central é uma tarefa difícil e cara – um ciclo de tratamento das doenças de Parkinson e de Alzheimer custa cerca de 1 milhão de dólares. Nos últimos 25 anos, cientistas de todo o mundo pesquisam meios de simplificar e aperfeiçoar este processo. Uma das principais dificuldades é não haver total conhecimento sobre os processos químicos que ocorrem no cérebro – diz a cientista e doutora em medicina Larissa Chigaleichik:
"O cérebro possui propriedades defensivas. Ele não aceita bem os remédios. Isto é, o remédio deve ser aplicado diretamente no cérebro para não se perder no fígado e não se destruir nos rins. Este é o principal problema. Agora estão sendo criadas novas variantes de introdução desses remédios em animais, estes problemas estão resolvidos."

"Os cientistas russos estão mais perto do êxito", diz a dirigente do Departamento de Química do Instituto de Pesquisa científica V. V. Zakussov, da Academia Russa das Ciências Médicas, Tatiana Gudasheva.

"Nós estudamos vários modelos de Alzheimer, vários modelos de Parkinson, vários modelos de derrame e em todos eles tivemos resultados positivos. Nós já obtivemos a patente russa. Agora estamos patenteando em outros países. Nós pedimos a patente americana, a patente europeia e entregamos o requerimento na Índia e China", afirma Tatiana.

Segundo o diretor do Instituto de Pesquisas Científicas de Farmacologia da Academia das Ciências Médicas da Rússia, Serguei Seredenin, a elaboração está na fase pré-clínica de pesquisas. Isto significa que a substância pode se tornar remédio já nos próximos anos.

Os cientistas russos pedem para não sobrestimar o significado da elaboração, até que ela passe por todos os testes pré-clínicos e clínicos. Somente depois deles, ela poderá se tornar medicamento. Farmacêuticos de diferentes pontos do mundo disseram reiteradas vezes que os remédios contra as doenças de Parkinson e Alzheimer podem ser criados já no futuro próximo.

Bem Estar

Cuidadores de parentes com Alzheimer relatam desafios do dia a dia


  • As mudanças e adaptações devem ser feitas levando em conta o perfil e a capacidade de cada paciente
    As mudanças e adaptações devem ser feitas levando em conta o perfil e a capacidade de cada paciente
"É um trabalho integral, de dedicação total, de corpo e mente. E por isso deve ser feito com muito amor", afirma Magali Pereira Lopes, aposentada, que há seis anos cuida de sua tia com Alzheimer.  Assumir o cuidado de uma pessoa com esta doença não é uma tarefa fácil, pois exige do cuidador – seja ele um familiar, um enfermeiro ou um acompanhante – dedicação, motivação e muito apoio. Mas também existem compensações.

O mal de Alzheimer é uma doença neurodegenerativa, ou seja, que causa a destruição progressiva e irreversível dos neurônios. A pessoa que sofre com a doença no início apresenta esquecimentos de coisas rotineiras, como uma conversa que acabou de ter ou um acontecimento recente.

Com o tempo, os esquecimentos se tornam mais frequentes e abrangem outros aspectos: a pessoa começa a sentir dificuldade para executar tarefas como fazer compras ou cozinhar, não se lembra do caminho de casa, confunde datas. Em seu estágio mais avançado, a pessoa com Alzheimer precisa de auxílio até para realizar as tarefas mais básicas, como se alimentar e se vestir.

Receber o diagnóstico de Alzheimer é assustador não apenas para a pessoa, mas para toda sua família. Isso não significa, porém, que a vida acabou. Muitos pacientes com Alzheimer conseguem conviver por anos com a doença e se manter independentes por muito tempo. "Muitos pacientes, se bem estimulados, têm excelente qualidade de vida, divertem-se, relacionam-se de maneira prazerosa e agradável e levam uma vida bem organizada", afirma a psicóloga Fernanda Gouveia Paulino, presidente da Abraz (Associação Brasileira de Alzheimer).

Quando sua mãe recebeu o diagnóstico da doença, há dois anos, a atriz Lara Córdula diz que ficou chocada. "Inicialmente foi muito duro. Tem toda aquela fase de não acreditar, dos meus irmãos não acreditarem. Tivemos que consultar três médicos para começarmos a aceitar. E eu ainda fiquei um ano me sentindo mal, achando que aquilo era injusto", conta.

Agora, porém, a atriz já conseguiu adaptar sua vida a essa nova realidade: ela acompanha sua mãe às diversas terapias e conversa abertamente com ela sobre a doença. "Eu ainda consigo conciliar meu trabalho com o cuidado da minha mãe, porque ela ainda é muito independente, ainda mora na casa dela, é muito lúcida e consegue conversar sobre sua situação – consegue até me acalmar às vezes", diz.

ADAPTANDO-SE A UMA NOVA REALIDADE

  • Arquivo pessoal
    A doença exige várias mudanças no estilo de vida da pessoa com Alzheimer e na de seu cuidador também. E para lidar com elas é preciso planejamento e flexibilidade. O primeiro passo é pensar na segurança do paciente, para evitar que se envolva em situações de risco, como se perder ou sofrer acidentes domésticos.

    Depois é preciso organizar uma rotina para garantir o bem-estar do paciente, incluindo a realização das tarefas diárias (horários para acordar, almoçar, tomar banho, medicamentos etc), atividades que estimulem intelectualmente e exercícios físicos como, por exemplo, caminhada. "Uma das melhores coisas foi aprender a rotina. Tem hora para levantar, tem hora para tomar banho, para comer, para passear, para dormir. Facilitou muito o cuidado", diz Lopes.

    "Eu ainda consigo conciliar meu trabalho com o cuidado da minha mãe, porque ela ainda é muito independente, ainda mora na casa dela, é muito lúcida e consegue conversar sobre sua situação – consegue até me acalmar às vezes", diz Lara Córdula (foto).

    O planejamento financeiro também é importante, pois todo esse cuidado exige a participação de vários profissionais (fonoaudiólogo, psiquiatra, fisioterapeuta etc), além de medicamentos e outros equipamentos que favoreçam a qualidade de vida da pessoa com Alzheimer. E isso acaba saindo caro.

    Todo esse planejamento e organização deverão ser refeitos periodicamente, de acordo com a evolução da doença e com as características dos pacientes. "Diante das dificuldades progressivas, a família passará por várias mudanças, pois a cada estágio da doença os desafios são diferentes. Por isso, readaptações devem ser constantes assim como a avaliação criteriosa das capacidades dos pacientes em cada momento", explica Paulino.
Gastos

Administrar os gastos com os cuidados com pacientes de Alzheimer também é um desafio a ser enfrentado. "Se você quer dar um bom tratamento, um bom cuidado, isso sai muito oneroso", aponta Córdula.

Os gastos mudam muito para cada paciente e também dependem do estágio da doença. Os medicamente são caros, e alguns pacientes ainda podem precisar de remédios para os sintomas comportamentais, o que encarece o tratamento. Há distribuição gratuita pelo governo, mas os critérios são bastante rigorosos e poucos pacientes cumprem todos os requisitos de inclusão no programa.

Nos estágios mais moderados podem ser indicados tratamentos específicos como fisioterapia e fonoaudiologia, e em estágios mais avançados pode ser necessária alimentação enteral, fralda, sugadores de saliva e outros equipamentos, que acabam tendo um alto custo.

"Eu levo minha tia no psiquiatra, tem a fonoaudióloga e a fisioterapeuta que vêm aqui em casa. E a gente ainda tem que pensar na preparação do ambiente, na alimentação. Enfim, não sai barato", afirma Lopes.

Respeito e independência

As mudanças e adaptações devem ser feitas levando em conta o perfil e a capacidade de cada paciente. Isso porque, apesar da crença generalizada de que  a doença de Alzheimer torna a pessoa totalmente incapaz e dependente, a verdade é que isso acontece apenas no estágio final.

Quando o paciente recebe o tratamento adequado e é estimulado, ele consegue realizar várias tarefas sozinho. "É muito importante que ele faça o máximo que puder e que seja auxiliado apenas nas situações em que não for capaz. Isso requer que a família seja flexível e absorva mudanças continuamente", enfatiza Paulino.

Córdula e Lopes seguem esse conselho à risca. "Nós vamos deixá-la o maior tempo possível em seu próprio espaço, tentando desempenhar as tarefas que consegue sozinha, respeitando sua vontade e sua independência", diz Córdula. "Hoje minha tia já está totalmente dependente me mim, para comer e se vestir, por exemplo. Mas o que ela ainda consegue fazer sozinha, eu a incentivo para que faça", afirma Lopes.

Para garantir uma boa qualidade de vida da pessoa com alzheimer, é preciso não apenas estimulá-la a executar tarefas sozinha, mas também respeitá-la, reconhecendo toda sua experiência de vida. "Há que se ressaltar que embora precise de cuidados, o idoso com a doença não passa a ser uma criança. Ele continua sendo fonte de sabedoria e experiência e merece o respeito antes dispensado a ele e tem que ter garantido seu papel e espaço nas relações familiares", diz Paulino.

O poder da informação

Buscar se informar é o primeiro passo para o cuidador. Afinal, o Alzheimer é uma doença cercada de mitos e preconceitos, e é fundamental conhecê-la melhor para poder lidar com ela. "Depois do diagnóstico, eu fui correr atrás de informações, querendo saber mais. Eu fiz de tudo: conversei com pessoas que tinham familiares com a doença e com médicos, pesquisei na internet, li muito. E isso foi me ajudando a lidar com a situação", conta Córdula.

O mesmo aconteceu com Lopes. Quando começou a cuidar da tia, ela sabia muito pouco sobre a doença. "Eu peguei o bonde andando, eu não sabia nada, precisei me informar, conhecer a doença, para poder cuidar dela". Ela conta que sua tia foi diagnosticada com Alzheimer há 11 anos, mas antes o cuidador era seu companheiro.
Porém, este senhor faleceu e Lopes assumiu a tarefa de cuidar da tia. Desde então não parou de procurar informações e ajuda para melhorar a qualidade de vida dela. "Quando comecei, ela estava em uma cadeira de rodas. Mas eu insisti, busquei ajudar, e tempos depois ela já não precisava mais da cadeira".

Para Paulino, a informação é fundamental para quem cuida de pessoas com o mal de Alzheimer, especialmente para diagnosticar mais precocemente a doença e para quebrar todo o preconceito que existe em torno dela. "O estereótipo de um paciente com Alzheimer ainda está associado a um idoso, acamado e incomunicável. Esse quadro pode aparecer em fases avançadas da doença e nossa luta é para que mais e mais pessoas possam ser diagnosticadas precocemente para que os prejuízos na qualidade de vida sejam minimizados e que as atividades de estimulação favoreçam uma existência com harmonia e tranquilidade".

Desafios vencidos

Os cuidadores de pessoas com mal de Alzheimer enfrentam desafios todos os dias. Isso porque as dificuldades são progressivas, a doença tem vários estágios e cada um deles exige mudanças e readaptações. Além disso, os cuidadores precisam se reorganizar no âmbito pessoal, familiar e social; muitas vezes precisam conciliar o trabalho com o cuidado e chegam até a deixar o emprego para poderem se dedicar melhor à pessoa.

Mas, apesar das dificuldades, é importante ressaltar que existem compensações. "O trabalho é desgastante, mas eu tenho recompensa todos os dias, porque ela é muito alegre e carinhosa, e toda hora diz que me ama", conta Lopes.

Muitas vezes, o Alzheimer acaba até mesmo sendo um motivo de união para a família, que se aproxima para cuidar do paciente. "No meu caso, essa situação uniu muito a família. Minha mãe virou um ponto em comum, e todos ficamos muito mais próximos dela", diz Córdula. Ela ainda afirma que a doença também é um espaço de aprendizagem e de redescoberta, e de muitas emoções. "Hoje foi um dia feliz, porque andei de mãos dadas com minha mãe, uma coisa que não fazia desde que eu era criança".

TODO O SUPORTE POSSÍVEL

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    Além de informação, é essencial que o cuidador receba todo o apoio possível. Existem vários grupos que dão suporte. Além de dar informações e orientar no cuidado da pessoa com alzheimer, esses grupos também são espaços em que os cuidadores podem compartilhar experiências e buscar apoio psicológico e emocional.

    "Há grupos de socialização com oferta de divisão de experiências e oportunidade de vivências fora da situação de adoecimento e também grupos de apoio psicológico em que além das trocas de experiências há espaço para exposição, acolhimento e elaboração de emoções associadas ao papel de cuidador", explica Paulino.

    É importante o cuidador saber que não está sozinho, e que pode contar com ajuda quando necessário – tanto dos grupos de apoio quanto dos familiares. "O grupo de apoio é meu porto seguro. Lá eu encontro conforto e vejo que não estou sozinha. Eu tenho 'apoio' mesmo, e é tudo o que eu preciso", diz Lopes.

    Alguns grupos de apoio:

    Associação Brasileira de Alzheimer (ABRAZ): possui 21 regionais e 58 sub-regionais nas cinco regiões do país.

    Grupo de Psicoterapia do Laboratório de Neurociências do Instituto de Psiquiatria (IPq) do Hospital das Clínicas (HC) da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP): oferece atendimento gratuito aos cuidadores de pacientes com Alzheimer em São Paulo (SP). Contato: grupopsicorpo@gmail.com

    Grupo de Apoio a Cuidadores de pacientes com Alzheimer do Hospital Rios D'Or: o hospital promove reuniões mensais com profissionais de diversas áreas que orientam e dão apoio aos cuidadores em Jacarepaguá (RJ).

    Hospital Universitário Clementino Fraga Filho (HUCFF- UFRJ): o grupo de apoio dá a preparação técnica para exercer a atividade de cuidador, além de fazer reuniões para trocar experiências e receber dicas.

Avanço na luta contra o Alzheimer

Novas pesquisas revelam estratégias para bloquear os processos moleculares que levam à doença degenerativa da memória.


O cérebro humano é um computador orgânico notadamente complexo. Além de captar uma grande variedade de experiências sensoriais, processa e armazena essas informações e lembra e integra fragmentos selecionados no momento certo. A destruição causada pela doença de Alzheimer pode ser comparada ao apagamento de um disco rígido, começando pelos arquivos mais recentes até os mais antigos. Um dos primeiros sinais é a incapacidade de recordar eventos recentes, enquanto lembranças antigas permanecem intactas. Mas conforme a doença progride, tanto as memórias novas quanto as velhas desaparecem gradualmente, até que as pessoas mais queridas deixam de ser reconhecidas. O medo do Alzheimer origina-se nem tanto da dor física e do sofrimento antecipados, mas da perda inexorável de lembranças de uma vida inteira, que são a base da identidade individual.Infelizmente, a analogia do computador acaba aí: não se pode simplesmente reinicializar o cérebro humano e recarregar arquivos e programas. O Alzheimer não apenas apaga informações, mas destrói o hardware cerebral, que é composto por mais de 100 bilhões de neurônios, com 100 trilhões de conexões entre eles. Medicamentos recentes aproveitam-se do fato de que muitos dos neurônios destruídos em decorrência da doença respondem pela liberação de acetilcolina. Como bloqueiam uma enzima responsável pela decomposição normal desse neurotransmissor, tais remédios aumentam o nível da acetilcolina que de outro modo estaria escassa. O resultado é estímulo neuronal e raciocínio mais claro, mas tais drogas se tornam ineficazes dentro de seis meses a um ano, porque não conseguem impedir a cruel devastação de neurônios.
Outra medicação, chamada memantina, parece retardar o declínio cognitivo em pacientes com Alzheimer moderado a severo por meio do bloqueio da atividade excessiva de outro neurotransmissor (glutamato), mas os pesquisadores ainda não determinaram se os efeitos persistem após o primeiro ano.
Mais de uma década atrás poucas pessoas eram otimistas a respeito das chances de derrotar o Alzheimer. Os cientistas sabiam muito pouco sobre a biologia da doença, e acreditava-se que suas origens e sua progressão eram irremediavelmente complexas. Recentemente, contudo, pesquisadores avançaram na compreensão dos eventos moleculares que parecem desencadear a enfermidade, e exploram agora diversas estratégias para desacelerar ou conter esses processos destrutivos.
Talvez um desses tratamentos, ou uma combinação deles, possa impedir a degeneração de neurônios o suficiente para interromper a trilha da doença. Várias terapias potenciais estão sendo submetidas a testes clínicos e já renderam resultados preliminares promissores. Mais e mais pesquisadores estão com esperança - uma palavra que raramente se associa ao Alzheimer.

Cascata Amilóide

As duas principais características da doença, observadas pela primeira vez pelo neurologista alemão Alois Alzheimer há cem anos, são placas e emaranhados de proteína no córtex cerebral e no sistema límbico - responsáveis pelas funções cerebrais superiores. As placas são acúmulos encontrados do lado de fora dos neurônios e são constituídas por uma pequena proteína chamada beta-amilóide, ou A-beta. Os emaranhados ficam dentro dos neurônios e de suas projeções ramificadas (axônios e dendritos) e são formados por filamentos da proteína tau. A constatação dessas anomalias iniciou um debate que se estendeu pelo século XX: as placas e emaranhados seriam responsáveis pela degeneração dos neurônios, ou apenas sinalizariam os lugares onde a morte neuronal já ocorreu? Na última década, as evidências penderam a favor da hipótese da "cascata amilóide", que sugere que as duas proteínas estão envolvidas na causa do mal de Alzheimer, com a A-beta iniciando a agressão.
Esta é um peptídeo curto, ou fragmento de proteína, isolado e descrito pela primeira vez em 1984 por George G. Glenner e Cai\\`ne W. Wong, então na Universidade da Califórnia de San Diego. A A-beta é derivada de uma proteína maior chamada de precursora de beta-amilóide, ou APP. As moléculas de APP fincam-se na membrana celular, com uma parte da proteína dentro da célula e outra para fora. Duas proteases (enzimas de quebra de proteína) - beta-secretase e gama-secretase - retiram a A-beta da APP, processo que ocorre em praticamente todas as células humanas. A razão pela qual as células produzem A-beta não é clara, mas o processo pode ser parte de uma rota de sinalização.
Antes de ser retirada, uma parte da A-beta fica no interior da membrana onde a APP se ligou, entre suas porções interna e externa. Como as membranas são compostas por lipídios hidrofóbicos, a região da proteína que atravessa a membrana contém aminoácidos hidrofóbicos. Quando a A-beta é arrancada da APP pelas secretases beta e gama e é liberada no ambiente aquoso fora da membrana, as áreas hidrofóbicas de diferentes moléculas A-beta unem-se umas às outras, formando pequenos blocos solúveis. No início dos anos 90, Peter T. Lansbury Jr., hoje na Escola Médica de Harvard, mostrou que, em concentrações altas, as moléculas A-beta em um tubo de ensaio podem se unir na forma de estruturas fibrosas similares às encontradas nas placas do mal de Alzheimer. Tanto as formações solúveis quanto as fibras de A-beta são tóxicas aos neurônios cultivados em laboratório, e as primeiras podem interferir em processos de aprendizado e memória em camundongos.
Essas descobertas apóiam a hipótese da cascata amilóide, mas a evidência mais forte veio do estudo de famílias com alto risco de desenvolver Alzheimer. Membros dessas famílias carregam mutações genéticas raras que os predestinam à doença precocemente - antes dos 60 anos. Em 1991, John A. Hardy, hoje no Instituto Nacional de Envelhecimento dos Estados Unidos, e colegas descobriram a primeira dessas mutações em um gene que codifica a APP, afetando especificamente as áreas da proteína dentro e ao redor da região A-beta. Pouco depois, Dennis J. Selkoe, de Harvard, e Steven Younkin, da Clínica Mayo em Jacksonville, Flórida, descobriram que essas mutações aumentam a formação ou da A-beta em geral ou de um tipo particular dela que é altamente propenso à formação de sedimentos. Além disso, pessoas com síndrome de Down, que carregam três cópias do cromossomo 21 em vez das duas regulares, têm incidência muito maior de Alzheimer na meia-idade. Como o cromossomo 21 contém o gene da APP, essas pessoas apresentam níveis mais altos de A-beta desde o nascimento, e acúmulos de amilóide podem ser encontrados em seu cérebro já aos 12 anos.
Há ainda outras conexões entre a doença de Alzheimer e os genes que regulam a produção da A-beta. Em 1995, Peter St. George-Hyslop e seus colegas da Universidade de Toronto identificaram mutações em dois genes relacionados, batizados de presenilina 1 e 2, que causam as formas mais precoces e agressivas do Alzheimer, aparecendo tipicamente na faixa dos 30 ou 40 anos. Tais mutações aumentam a proporção de A-beta propensa a se aglomerar. Hoje se sabe que as proteínas codificadas pelos genes presenilina são parte da enzima gama-secretase.
Dessa forma, dos três genes reconhecidos como causadores do Alzheimer precoce, um codifica o precursor da A-beta e os outros dois especificam componentes de uma enzima protease que ajudam a produzir o peptídeo maligno. Além disso, cientistas descobriram que pessoas portadoras de uma certa variação no gene que codifica a apolipoproteína E - proteína que ajuda a agrupar os peptídeos A-beta em conglomerados e filamentos - têm risco elevado de desenvolver Alzheimer posteriormente. Diversos fatores genéticos provavelmente tenham papel no princípio da doença, cada qual dando uma pequena contribuição, e estudos em camundongos indicam que fatores ambientais alteram o risco da enfermidade (exercícios, por exemplo, podem reduzi-lo).
Os cientistas ainda não entendem exatamente como os blocos solúveis e os filamentos insolúveis de A-beta rompem e matam neurônios. Acredita-se que conglomerados de A-beta do lado de fora de um neurônio podem iniciar uma cascata de eventos que inclui a alteração das proteínas tau dentro da célula. Em particular, os conglomerados A-beta chegam até a modificar a atividade celular de enzimas quinases, que instalam fosfatos nas proteínas. As quinases afetadas adicionam fosfato em excesso à tau, mudando as propriedades químicas das proteínas e fazendo com que formem filamentos espiralados. As tau alteradas de algum modo matam o neurônio, talvez rompendo os microtúbulos que transportam proteínas através dos axônios e dendritos. Mutações no gene da tau geram filamentos na proteína e causam outras doenças neurodegenerativas. Assim, a formação de filamentos de tau é aparentemente um evento mais geral que leva à morte neuronal, enquanto a A-beta é um promotor específico de Alzheimer.

Drogas Inibidoras

dado o papel crítico da A-beta no processo da doença, as proteases que produzem esse peptídeo são alvos certos de potenciais drogas para inibir sua atividade. Inibidores de protease provaram-se muito eficientes no tratamento de doenças como aids e hipertensão. O primeiro passo na formação da A-beta é dado pela beta-secretase, protease que corta a maior parte da APP imediatamente externa à membrana celular. Em 1999, cinco diferentes grupos de pesquisa descobriram essa enzima, que é particularmente abundante nos neurônios cerebrais. Embora a beta-secretase seja amarrada à membrana, ela se parece muito com um conjunto de proteases encontrado em ambientes aquosos dentro e fora de células. Membros desse conjunto usam ácido aspártico, um tipo de aminoácido, para catalisar a reação de quebra de proteína. Todas as proteases usam água para quebrar suas respectivas proteínas, e enzimas da família aspartil-protease empregam um par do ácido para ativar a molécula da água para esse fim.
Como a beta-secretase se encaixa nessa família, os pesquisadores puderam tirar proveito do amplo conhecimento que se tem sobre essas proteases, chegando a uma compreensão de como silenciá-la. Sua estrutura tridimensional, que já era conhecida, foi utilizada como guia para o projeto computadorizado de potenciais drogas inibidoras. Estudos genéticos sugerem que bloquear a atividade da enzima não levará a efeitos colaterais prejudiciais; o desligamento do gene codificador da beta-secretase eliminou a formação de A-beta no cérebro de roedores sem trazer nenhuma conseqüência negativa aparente. Até o momento, porém, esses inibidores não estão prontos para testes clínicos. O maior desafio é desenvolver compostos potentes pequenos o suficiente para penetrar o cérebro. Diferentemente dos vasos sangüíneos em outras partes do corpo humano, os capilares do cérebro são forrados de células endoteliais bem comprimidas. Como há pouco espaço entre as células, os inibidores de protease têm de ser capazes de passar pelas membranas celulares para chegar aos tecidos cerebrais posteriores, e a maioria das grandes moléculas não consegue ultrapassar essa barreira hematoencefálica.
A enzima conhecida como gama-secretase executa o passo seguinte na formação de A-beta, cortando o pedaço de APP restante depois da clivagem feita pela beta-secretase. Essa segunda protease realiza a rara façanha de usar água para quebrar a proteína dentro do ambiente normalmente hidrofóbico da membrana celular. Duas pesquisas ajudam a compreender seu funcionamento. Em 1998, Bart De Strooper, da Universidade Católica de Louvain, Bélgica, descobriu que eliminar o gene que codifica a presenilina em camundongos reduz em grande medida a quebra de APP pela gama-secretase, demonstrando que essa proteína é essencial à função enzimática. Depois, meu laboratório, então na Universidade do Tennessee, em Memphis, descobriu que compostos da mesma categoria química que os inibidores clássicos de aspartil-proteases poderiam bloquear a clivagem de APP pela gama-secretase nas células. O resultado sugeriu que ela contém um par de ácidos aspárticos essencial para catalisar a reação de quebra de proteína.
Com base nessas observações, levantamos a hipótese de que a proteína presenilina seria uma aspartil-protease incomum pregada no tecido das membranas celulares. Durante meu ano sabático no laboratório de Selkoe em Harvard, e em colaboração com Weiming Xia, identificamos dois ácidos aspárticos na presenilina que deveria estar dentro da membrana e demonstramos que ambos são críticos para a clivagem da gama-secretase que produz A-beta. Posteriormente, demonstramos que os inibidores de gama-secretase unem-se diretamente à presenilina, e que três outras proteínas embutidas na membrana têm de juntar-se a ela para permitir sua catalisação. Hoje a gama-secretase é reconhecida como membro fundador de uma nova classe de proteases que aparentemente empunham água dentro das membranas celulares para executar suas tarefas bioquímicas. Melhor ainda, seus inibidores são moléculas relativamente pequenas que podem atravessá-las, o que os habilita a penetrar a barreira hematoencefálica.
Entretanto, o potencial da gama-secretase como alvo terapêutico é moderado pelo fato de que essa enzima desempenha papel crucial na maturação de células precursoras indiferenciadas em várias partes do corpo, tais como as células-tronco na medula óssea, que evoluem para células vermelhas do sangue ou linfócitos. Especificamente, a gama-secretase corta uma proteína da superfície celular chamada Notch, que, liberada da membrana para dentro da célula, envia um sinal ao núcleo que controla o destino da célula.
Doses altas de inibidores de gama-secretase provocam efeitos tóxicos severos em camundongos em virtude da interrupção do sinal da Notch, o que gerou receio quanto a esse potencial tratamento. Contudo, uma droga candidata desenvolvida pelo fabricante farmacêutico Eli Lilly passou pelos testes de segurança em voluntários. O composto está agora prestes a entrar no próximo nível de testes em pacientes com Alzheimer precoce. Além disso, pesquisadores identificaram moléculas que ajustam a gama-secretase de modo que a produção de A-beta seja bloqueada sem afetar o corte da Notch. Tais moléculas não interagem com os ácidos aspárticos; eles se atam a outro ponto da enzima e alteram sua forma.
Alguns inibidores conseguem até reduzir a criação da versão de A-beta mais propensa a se agregar em favor de um peptídeo mais curto, que não se cristaliza tão facilmente. Uma dessas drogas, Flurizan, identificada por uma equipe de pesquisadores liderados por Edward Koo, da Universidade da Califórnia de San Diego, e Todd Golde, da Clínia Mayo, mostrou-se consideravelmente promissora em pacientes nos estágios iniciais de Alzheimer e já está entrando em testes clínicos mais avançados, que incluirão mais de mil pessoas nos Estados Unidos.

Limpeza das Teias

Outra estratégia para combater a doença é livrar o cérebro dos aglomerados tóxicos de A-beta depois que o peptídeo é produzido. Uma abordagem é a imunização ativa, que pressupõe recrutar o próprio sistema imunológico do paciente para atacar a proteína. Em 1999, Dale B. Schenk e seus colegas da Elan Corporation fizeram uma descoberta pioneira: a injeção de A-beta em camundongos geneticamente projetados para desenvolver placas amilóides estimulou uma resposta imune que impediu a formação de placas no cérebro dos animais jovens e limpou as já existentes nos mais velhos. Os roedores produziram anticorpos que reconheceram a A-beta e aparentemente estimularam as células imunes do cérebro - micróglias - a atacar conglomerados do peptídeo . Em camundongos, houve melhoras no aprendizado e na memória, o que levou ao início de testes em humanos.
Infelizmente, embora a injeção de A-beta tenha passado pelos testes de segurança iniciais, diversos pacientes desenvolveram encefalite - inflamação do cérebro - o que acarretou a suspensão prematura do estudo em 2002. A pesquisa de acompanhamento indicou que o tratamento pode ter causado a inflamação ao estimular as células T do sistema imunológico a executar ataques excessivamente agressivos aos depósitos de A-beta. No entanto, a investigação confirmou que muitos pacientes produziram anticorpos contra a A-beta, e aqueles que o fizeram mostraram sinais sutis de melhora de memória e concentração.
As preocupações de segurança com a imunização ativa levaram alguns pesquisadores a tentar a imunização passiva, que tem como objetivo eliminar o peptídeo por meio da injeção de anticorpos nos pacientes. Produzidos em células de cobaias e programados geneticamente para impedir a rejeição em humanos, esses anticorpos dificilmente provocariam encefalite, já que não disparariam uma resposta nociva das células T no cérebro. Um tratamento por imunização passiva desenvolvido pela Elan Corporation já avançou para os testes clínicos em humanos.
Como a imunização ativa ou passiva remove a A-beta do cérebro é de certa forma um mistério, porque não está claro quão efetivamente esses anticorpos conseguem atravessar a barreira hematoencefálica. Algumas evidências sugerem que a entrada no cérebro pode nem ser necessária: talvez a absorção da A-beta no resto do corpo provoque um êxodo do peptídeo do cérebro, porque as moléculas tendem a mover-se das altas concentrações para as mais baixas. Embora a imunização passiva pareça agora ser a mais promissora, a ativa ainda não foi descartada. Estudos preliminares conduzidos por Cynthia Lemere em Harvard mostram que a imunização com partes selecionadas da A-beta, em vez de usar o peptídeo inteiro, pode estimular a produção de anticorpos pelas células B do sistema imunológico, sem ativar as células T, responsáveis pela encefalite.
Outros pesquisadores testam estratégias não-imunológicas para impedir a aglutinação de A-beta. Alguns compostos interagem diretamente com a proteína para mantê-la dissolvida no líquido fora dos neurônios cerebrais, prevenindo a formação de blocos nocivos. A Neurochem, em Quebec, está desenvolvendo a Alzhemed, uma pequena molécula que aparentemente imita a heparina, um anticoagulante natural. No sangue, a heparina impede que as plaquetas formem coágulos, mas quando ela se junta à A-beta, torna o peptídeo mais apto à formação de depósito. Como a Alzhemed liga-se a esses mesmos pontos da A-beta, ela bloqueia a atividade da heparina e, assim, reduz a aglutinação. O composto mostrou pouca ou nenhuma toxicidade mesmo em altas dosagens, e o tratamento levou a certa melhora cognitiva em pacientes com Alzheimer moderado. Os testes clínicos de fase 3 para essa droga já estão bem adiantados.

De Olho na Tau

A amilóide, contudo, é apenas metade da equação do Alzheimer. A outra metade, os filamentos de tau que causam emaranhados neurais, é considerada um alvo promissor na prevenção da degeneração dos neurônios cerebrais. Pesquisadores estão concentrados em projetar inibidores que possam bloquear as quinases que fixam uma quantidade excessiva de fosfatos na tau, o que é um passo essencial para a formação de filamentos. Tais esforços ainda não resultaram em drogas candidatas a testes clínicos, mas a esperança é que esses agentes trabalhem futuramente com aqueles cujo alvo é a A-beta.
Pesquisadores examinam também se as estatinas - drogas para baixar o colesterol amplamente usadas para reduzir o risco de doenças cardíacas - poderiam atuar contra o Alzheimer. Estudos epidemiológicos sugerem que pessoas que tomam estatinas têm menos risco de desenvolver a doença. O motivo desta correlação não é inteiramente claro; ao baixar os níveis do colesterol, é possível que essas drogas reduzam a produção de APP, ou talvez elas afetem diretamente a criação de A-beta por meio da inibição da atividade das secretases responsáveis. Testes clínicos tentam estabelecer se estatinas podem de fato prevenir o Alzheimer.
Outro empolgante avanço recente implica terapia celular. Mark Tuszynski e seus colegas da Universidade da Califórnia det San Diego realizaram biópsias da pele de pacientes com Alzheimer brando e inseriram nela o gene codificador do fator de crescimento neural (NGF, na sigla em inglês). As células geneticamente modificadas foram então introduzidas cirurgicamente no cérebro desses pacientes. A idéia era que elas produzissem e secretassem NGF, o que preveniria a perda de neurônios produtores de acetilcolina e melhoraria a memória. A terapia baseada em células foi uma estratégia inteligente para distribuir o NGF, proteína grande que, de outra maneira, não conseguiria entrar no cérebro. Embora o estudo tenha incluído poucos indivíduos e carecido de controles importantes, pesquisas de acompanhamento mostraram redução do declínio cognitivo nos pacientes. Os resultados foram bons o bastante para justificar testes clínicos adicionais.
Embora algumas dessas potenciais terapias não cumpram suas promessas, os cientistas esperam encontrar ao menos um agente que possa efetivamente desacelerar ou interromper a perda gradual de neurônios no cérebro - progresso que salvaria milhões de pessoas do declínio inexorável da doença de Alzheimer e abriria caminho para medicamentos regeneradores das funções mentais perdidas.
Mirar na A-beta pode impedir o início do Alzheimer ou retardá-lo precocemente, mas se essa estratégia irá curar aqueles em estágios mais avançados da doença ainda não se sabe. Mesmo assim, os pesquisadores têm bons motivos para o otimismo cauteloso. A recente enxurrada de descobertas nos convenceu que a busca por maneiras de prevenir e tratar o Alzheimer não será em vão.

Leandro Teles, neurologista

VEICULADO NA MÍDIA ONLINE

Alzheimer, quando a dificuldade de memória torna-se preocupante

Com o progressivo envelhecimento da população estão cada vez mais freqüentes as queixas de distúrbios de memória. Mais do que isso, o próprio ritmo frenético de vida aliado ao bombardeio de informações gera disfunções que simulam a dificuldade de memória propriamente dita em pacientes cada vez mais jovens.
É fato ! Está cada vez mais difícil encontrar pessoas acima dos 40 anos sem queixa de lapsos de memória. A primeira distinção importante a ser feita é entre declínio da MEMÓRIA por uma doença subjacente (Alzheimer, por exemplo) e alterações benignas do processo de retenção / recordação, geralmente frutos de dificuldade no processo de ATENÇÃO (causado por exemplo por depressão, ansiedade, distúrbios do sono, stress, etc…). Portanto, a distinção inicial é entre dificuldade real de memória (mais preocupante) e dificuldade de atenção (menos preocupante).
Uma avaliação neurológica pormenorizada é geralmente capaz de diferenciar as duas situações acima sem muita dificuldade (principalmente com uso de testes específicos de atenção e memória).
Quem está desatento acaba não memorizando. Veja um exemplo: quando entramos no Shopping (com presa para variar) a fim de escolher um presente para um amigo. Entramos na loja, compramos o presente e, na hora de ir embora: cadê o carro ?. Pronto, estamos com Alzheimer… na verdade ao estacionar o carro nossa mente estava focada em outro problema (o atraso, o presente do amigo, o trabalho, etc…). O local de estacionamento não foi memorizado pois a ATENÇÃO não deu relevância para a informação. Isso ocorre com todo mundo vez ou outra, em algumas fases da vida a exacerbação desse processo por simular doenças de MEMÓRIA.
Os distúrbios reais do processo de MEMÓRIA são geralmente secundários a doenças degenerativas (doença de Alzheimer, por exemplo) relacionadas a idade mais avançada (acima de 60 anos). A senilidade (envelhecimento normal) é geralmente acompanhada por um leve declínio da capacidade de memorizar as coisas do dia–a–dia. Esse declínio natural geralmente NÃO compromete as atividades diárias do paciente, não acomete outras funções intelectuais, não alterando o grau de independência do paciente.
Se esse processo mostra-se mais intenso um Neurologista deve ser imediatamente consultado. Não é aceitável atualmente, com os avanços das técnicas diagnósticas e terapêuticas o atraso na busca de ajuda. É comum o atraso do diagnóstico causado por um conceito perigoso de atribuir à idade do paciente um sintoma decorrente de uma doença subjacente. “Pra idade dele ele está até bem ….”, é uma frase comum, mesmo que aja inúmeras pessoas com a mesma idade em melhores condições intelectuais. Temos que ter cuidados para não menosprezar os sintomas e privarmos nosso familiar de diagnostico e tratamentos precoces.